Não estamos preparados. Você com certeza já teve essa sensação e não é só porque o mundo está um caos… quantas e quantas vezes encaramos situações sem ter recursos (internos ou externos) para atravessá-la. Em nossos pequenos mundos individuais ou em larga escala, isso sempre aconteceu.
A todo tempo, somos influenciados por estímulos que vêm de nós mesmos (sentimentos, pensamentos, emoções, sensações), das pessoas à nossa volta e do mundo externo.
Essas influências geram aprendizados, que se cristalizam em decisões, comportamentos, atitudes e hábitos que podem se enraizar e criar desde o nosso jeito de ser até sistemas inteiros — como o capitalismo por exemplo, que nos influenciam como humanidade.
A neurociência nos ajuda a conhecer e refletir sobre como nos comportamos e vivenciamos as experiências.
Ela é uma vasta área do conhecimento e, para o tema deste texto, vale um recorte. A ideia é compreender um pouco como a neurociência cognitiva enxerga a forma como aprendemos.
Mas o que é neurociência cognitiva? É uma área da neurociência que investiga o funcionamento do cérebro e identifica as regiões onde acontecem nossas percepções — auditivas, visuais e sensoriais, além de estudar como planejamos conscientemente nosso comportamento, como nosso cérebro programa nossas ações, identificando processos como: aprendizagem, linguagem, comportamento.
Ou seja, a neurociência cognitiva estuda a complexidade e o dinamismo cerebral e as funções mentais superiores: cognição, aprendizagem, linguagem.
Após essa breve explicação, é importante lembrar que a neurociência evoluiu grandemente. Em sua teoria clássica, os estudos consideravam as dinâmicas cerebrais sem a influência do mundo externo. Porém, a teoria contemporânea da neurociência, beneficiada grandemente pela contribuição do neurocientista russo Vygotsky, leva em consideração o meio externo, abordando a consciência a partir das construções cognitivas que dão “origem a novos sistemas de comportamento, mais do que pelas propriedades internas dos neurônios”, ou seja, a neurociência contemporânea considera a influência do meio externo em nosso aprendizado.
Preste atenção nesta frase:
Aprender MODIFICA as estruturas do cérebro.
Aparentemente ela pode nos remeter a modificações físicas, mas o grande ponto que ela traz é que, conforme nosso cérebro aprende, ele passa a regular nosso comportamento e nossas emoções.
Segundo Vygotsky:
“A nossa atenção, memória, percepções, pensamento, consciência, comportamento emocional, aprendizagem e linguagem, acontecem em áreas cerebrais (…) e se integram funcionalmente e são influenciadas ativamente pelo meio sociocultural, nas relações sociais do homem. Estas funções mentais superiores são cognitivamente importantes para a aprendizagem numa relação intrínseca com a linguagem, mediando nossas funções psicointelectuais.”
Se considerarmos que aquilo que aprendemos, modifica nosso cérebro e consequentemente modifica nosso comportamento, o que você quer aprender? Como você quer se comportar? Como você quer ser?
Essas perguntas podem ser um pouco difíceis de responder, especialmente se você parar para refletir. Vivemos em um mundo em que muitas pessoas querem a todo tempo ser algo diferente, infelizes com aquilo que são. As redes sociais escancaram este padrão, porém atenção: este padrão sempre esteve presente. Se considerarmos a história da humanidade e todas as lutas por poder, riquezas, posses, beleza são frutos da comparação, do olhar para fora e do não reconhecimento do que a vida nos oferece e do que já somos em essência.
E este padrão, vigente desde “sempre” só nos gerou infelicidade. Você já parou para observar isso? Continuamos insistindo nos mesmos caminhos neurais que criam infelicidade e não satisfação, amor genuíno, contato com o que há de realmente humano e natural.
E é aí que entra uma nova tecnologia: o Metaverso.
Segundo Walter Longo, o Metaverso “é uma representação digital de nosso mundo físico, sem perda de continuidade de tempo e espaço.”
A tecnologia ainda está se desenvolvendo, mas com a promessa da criação de um universo paralelo, onde poderemos transitar com nossos avatares, “sendo aquilo que escolhemos ser”.
Em sua palestra intitulada “Metaverso: onde você vai viver e trabalhar em breve”, disponível no Youtube, Walter Longo traz algumas razões potenciais para futuro sucesso do Metaverso.
- Pessoas querem ser o que não são;
- Pessoas gostariam de ter outra vida;
- Pessoas não estão satisfeitas com sua aparência;
- Pessoas fingem ser diferentes;
- Pessoas querem que outros as achem melhores do que são.
Agora imagine que uma pessoa com as características acima crie seu avatar no Metaverso e escolha “ser” aquilo que ela gostaria: talvez uma cintura mais fina, uma pele sem manchas, um determinado estilo de se vestir. Essa pessoa vai comprar para seu avatar um tênis estiloso, uma bolsa e vai interagir com outros avatares, de pessoas que não são elas mesmas.
E o cérebro, que cria suas próprias estruturas conforme aprende, segue exposto a estímulos cada vez mais intensos de comparação, de fingir ser o que não é, de não encarar a realidade, a experiência direta e real de um ser humano encarnado em um corpo físico.
O que pode acontecer com essa pessoa quando ela se deparar com um sofrimento real, tangível, com os desafios que nosso mundo está enfrentando como a crise climática, por exemplo? Haverá alguma estrutura interna onde se ancorar? Haverá algum recurso interno para a tomada de decisões?
Entendo que o Metaverso como tecnologia não é bom nem ruim. A tecnologia por si não tem ética, é neutra e depende de quem usa.
Então, deixo para você a pergunta: O que você quer ensinar a seu cérebro?
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A cuidadoria promove uma comunidade de aprendizagem e um dos temas que temos discutido é justamente a neurociência e como ela pode nos oferecer clareza para transitarmos e escolhermos o que queremos aprender, como ter mais inteligência emocional e como o aprendizado do cérebro afeta nosso nível de felicidade. Os encontros são gratuitos. Para saber da agenda e participar, é só clicar aqui
Referência:
VYGOTSKY, L.S.; LURIA, A.R.; LEONTIEV, A.N. Linguagem, Desenvolvimento e Aprendizagem. 2006.