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Emergência Climática, Ecoansiedade e Liderança

por Henrique Katahira

As ondas de calor extremo que atingem São Paulo e outras regiões do Brasil tornaram-se cada vez mais frequentes devido às mudanças climáticas globais. Esses fenômenos não apenas representam uma ameaça ao meio ambiente, mas também têm implicações significativas para a saúde física e psicológica das pessoas.

Segundo artigo da BBC News Brasil publicado em 8 de novembro, é praticamente certo que 2023 — com as suas inundações, incêndios e ondas mortais de calor — será o ano mais quente já registrado.

Combinando as emissões de gases de efeito estufa com o fenômeno El Niño, novembro foi o quinto mês consecutivo de calor recorde.

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Fonte: BBC News Brasil — Artigo publicado em 8 de novembro de 2023

No dia 13 de novembro, São Paulo registrava 37,9º C, a tarde mais quente de 2023. Nesse mesmo dia, a alta demanda de energia provocou a falta de luz na cidade. Na semana anterior um temporal provocou a falta de luz que afetou mais de 2 milhões de residências e deixou milhares sem luz por 6 dias. Fenômenos como esses serão cada vez mais comuns daqui para frente.

Emergência Climática e Saúde Física

As ondas de calor extremo combinadas com fatores como baixa umidade podem resultar em consequências diretas para a saúde física das pessoas. A exposição prolongada ao calor intenso pode levar a problemas como desidratação, insolação e complicações cardiovasculares, principalmente nas pessoas mais vulneráveis. Além disso, eventos climáticos extremos estão ligados ao aumento de doenças transmitidas por vetores, aumentando consideravelmente os riscos à saúde.

Isso preocupa principalmente as camadas mais pobres da população. Pessoas que dependem de transporte público, que executam trabalhos operacionais, que trabalham em fábricas, na construção civil ou na cozinha de restaurantes são as mais afetadas e as normas de segurança do trabalho precisam ser revistas.

Pessoas que trabalham em escritórios ou home-office também sofrem mas em menor grau. Muitas reclamam de problemas para dormir, dores de cabeça, aumento do estresse, ou perda de produtividade. A realidade é que a maioria das casas e dos escritórios não está dimensionada para o calor extremo.

Qual é a temperatura máxima permitida para que se possa trabalhar de forma segura numa cozinha, numa obra, numa fábrica ou num escritório? Como mitigar riscos de segurança do trabalho em casos de calor extremo? Como manter a operação funcionando com os riscos climáticos? São algumas perguntas que a liderança precisa se fazer nesse contexto.

Ecoansiedade e Saúde Psicológica

A constante exposição a eventos climáticos extremos e as notícias sobre as mudanças climáticas têm contribuído para um fenômeno chamado ecoansiedade. A American Psychology Association (APA) descreve a eco-ansiedade como “o medo crônico de sofrer um cataclismo ambiental que ocorre ao observar o impacto, aparentemente irrevogável, das mudanças climáticas gerando uma preocupação associada ao futuro de si mesmo e das gerações futuras”. Este estado de ansiedade relacionado ao clima é impulsionado pelo medo do futuro incerto, perda de biodiversidade e danos irreparáveis ao meio ambiente. A saúde psicológica das pessoas está sendo afetada por essa ansiedade crescente, levando a problemas como estresse, depressão e outros distúrbios mentais.

De acordo com artigo publicado na Exame, 93% dos europeus participantes do estudo Eurobarômetro, de 2021, acham que a mudança climática é um problema sério e 78% acham que é muito sério, causando algum tipo de ansiedade.

A ecoansiedade não impacta todas as pessoas da mesma maneira, costumando afetar mais aquelas que possuem uma consciência ecológica mais aguçada. Os sintomas incluem leve ansiedade, estresse, distúrbios do sono, nervosismo, entre outros. Em casos mais graves, a ecoansiedade pode desencadear sensações como asfixia e até mesmo levar à depressão. No grupo mais afetado, é comum observar expressões intensas de culpa em relação ao estado do planeta, especialmente quando consideram o futuro de seus filhos, o que pode agravar ainda mais o quadro.

É muito provável que a ecoansiedade ou outros transtornos psicológicos relacionados ao clima estejam presentes na sua organização e é necessário abrir espaços de conversa, acolhimento e tratamento para que isso não afete negativamente a saúde dos seus colaboradores.

O Papel da Liderança

A liderança das organizações desempenham um papel crucial na resposta a eventos climáticos extremos. Adotar práticas sustentáveis e estratégias de ESG (Ambiental, Social e Governança) não apenas contribui para a mitigação das mudanças climáticas e aumento da resiliência, mas também protege a saúde física, psicológica e mental dos colaboradores. Empresas engajadas em práticas ambientalmente responsáveis podem ser agentes de mudança positiva na sociedade.

É muito provável que você que ocupa um cargo de liderança (ou é líder por influência) esteja sentindo a pressão de lidar com essa batata quente (literalmente!) e que também sinta um pouco de ecoansiedade. Como disse uma vez Barack Obama “Nós somos a primeira geração a sentir na pele os efeitos das mudanças climáticas e a última geração que pode fazer algo a respeito”.

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“Nós somos a primeira geração a sentir na pele os efeitos das mudanças climáticas e a última geração que pode fazer algo a respeito.” — Barack Obama

Estar numa posição de liderança com privilégios e responsabilidades pode ser assustador nesse contexto e é fácil cair no ciclo de ansiedade, culpa e apatia. Por outro lado podemos usar o privilégio e o senso de urgência para para cuidar das pessoas e do planeta que tanto amamos. Sair da apatia e ir para a ação. Como disse Obama, talvez esta seja a nossa última chance de entendermos que somos todos parte da natureza, interconectados e interdependentes e que precisamos ser os agentes da mudança que queremos ver no mundo.

Trabalho que Reconecta: Da apatia para a ação

Bill O’Brien, ex-CEO da Hanover Insurance afirma que “o sucesso de uma intervenção depende da condição interna do interventor”. Não conseguiremos intervir e promover as mudanças nos sistemas nos quais estamos inseridos se não estivermos bem fisicamente, mentalmente e psicologicamente. É extremamente desafiador estar equilibrado e saudável em tempos difíceis como esse e talvez contra-intuitivo achar que precisamos nos cuidar enquanto há milhares de pessoas sofrendo. Mas precisamos colocar a máscara de oxigênio primeiro em nós mesmos antes de ajudar a pessoa do lado.

Joanna Macy, PhD, ativista ambiental e autora do livro Esperança Ativa: Como encarar o caos que vivemos sem emlouquecer (Bambual, 2020) sugere um caminho para sair da apatia (raiva estagnada) e ir para a ação (raiva redirecionada) a partir de uma espiral de 4 etapas:

1 — Gratidão

A espiral começa com gratidão, pois ela ajuda a acalmar a mente e estimular a confiança. Ao expressar o nosso amor pela vida na Terra e gratidão pela oportunidade de vivermos uma experiência humana, podemos estar mais presentes para reconhecer a dor que carregamos pelo mundo.

2 — Honrar a dor que sentimos pelo mundo

Entrando em contato com as dores que sentimos pelo mundo e expressando-as ganhamos uma compreensão mais profunda da compaixão, que verdadeiramente significa “sofrer com”.

3 — Ver com novos olhos

Perceber a vida a partir de uma nova perspectiva nos ajuda a compreender a nossa interdependência com o universo. É um ponto de inflexão onde nos damos conta do poder da mudança e sua conexão com as gerações futuras e espécies não-humanas.

4 — Seguir andando

Assim, seguimos andando para realizar ações de acordo com nossos talentos e habilidades. Em vez de esperar por um mapa infalível ou um plano à prova de erros, reconhecemos que cada passo revelará novas perspectivas e oportunidades. Mesmo quando enfrentamos desafios em uma iniciativa específica, valorizamos a oportunidade e as lições que ela nos proporciona.

À medida que eventos climáticos extremos continuam a ameaçar a saúde física, mentais e psicológica das pessoas e a sobrevivência da própria organização a liderança precisa desenvolver habilidades internas como escuta, presença, resiliência, empatia, compaixão e confiança, assim como aplicar ferramentas como o framework do Trabalho que Reconecta para ganhar forças e enfrentar os desafios impostos pela emergência climática. Assim podemos construir um futuro mais sustentável e resiliente para as próximas gerações.

Quer saber mais sobre como desenvolver as habilidades internas ou o Trabalho que Reconecta? Comente ou mande uma mensagem!