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Como Liderar a Criação de Culturas Mentalmente Saudáveis

por Henrique Katahira

Sabemos que saúde mental é essencial para criarmos organizações mais criativas, com baixos níveis de absenteísmo, baixa rotatividade, altos níveis de engajamento e produtividade, mas poucas empresas a colocam como prioridade. O que há por trás disso? Se há tantos estudos comprovando os benefícios e o ROI (Return on Investment ou retorno sobre investimento) em saúde mental, por que tão pouco é feito e o número de pessoas afastadas por burnout cresce a cada ano?

Esta lacuna entre o reconhecimento da importância da saúde mental e a implementação de práticas pode explicado por vários fatores como o medo de trazer a questão para discussão, priorização de projetos com retornos de curto prazo ou a inércia organizacional (“aqui sempre funcionou assim”). Se saúde mental é um tema que ainda não é prioridade na sua organização (ou na equipe que você lidera), o que impede que ela faça parte da estratégia e/ou da cultura? Como criar uma cultura em que a manutenção não só da saúde mental como a física, emocional e espiritual sejam valorizados e estratégicos?

Em uma entrevista no canal de Lewis Howes no YouTube, o médico canadense Gabor Maté, autor de “O Mito do Normal: Trauma, Saúde e Cura em um Mundo Doente” (Sextante, 2023), cita uma crença do povo originário Hopi da América do Norte que diz que toda vez que alguém aparece doente na aldeia, toda a comunidade se junta e agradece a pessoa, pois ela está carregando uma disfunção na sua cultura, e que a cura desta pessoa significa a cura do próprio coletivo.

Este conceito ancestral de olhar para a saúde de uma cultura de forma sistêmica, onde a doença de uma pessoa é o sintoma de uma disfunção cultural se encaixa perfeitamente com o conceito moderno de salutogênese, originalmente desenvolvido pelo sociólogo médico Aaron Antonovsky na década de 1970 e mais tarde explorado por Daniel Wahl em seu trabalho sobre “Design de Culturas Regenerativas”. Salutogênese é um termo que vem do latim “salus”, que significa saúde, e do grego “genesis”, que significa origem. Contrapondo-se ao conceito de patogênese, que foca na origem e nos fatores que causam doenças, a salutogênese se concentra nos aspectos que promovem a saúde e o bem-estar humanos.


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Wahl expande o conceito de salutogênese para além da saúde individual, aplicando-o ao design de sistemas e culturas. A ideia é projetar e fomentar ambientes que naturalmente gerem e sustentem a saúde e o bem-estar, tanto em níveis individuais quanto coletivos, criando culturas com mais vitalidade de resiliência. Isto é feito ao identificar e fortalecer os fatores que permitem às pessoas e sistemas se adaptarem, evoluírem e prosperarem.

Como Aplicar a Salutogênese na Criação de Culturas Mentalmente Saudáveis?

  1. Abordagem Apreciativa:

Em uma cultura organizacional, isto se traduz em focar nos padrões que funcionam e que mantém os colaboradores engajados, motivados e felizes, em vez de apenas tentar reparar os problemas depois que eles surgem.

2. Promover a Resiliência:

Culturas salutogênicas fortalecem a resiliência dos colaboradores, incentivando o desenvolvimento pessoal e profissional e fornecendo recursos para lidar com desafios e estresse.

3. Autenticidade e Integralidade:

Encorajar uma cultura onde a autenticidade é valorizada, onde os colaboradores podem trazer sua integralidade para o trabalho, incluindo vulnerabilidades e emoções, o que promove conexões humanas genuínas.

4. Conexão com o Propósito:

Alinhar os objetivos da organização com os valores pessoais dos colaboradores cria um sentido de propósito, que é vital para a saúde mental e a motivação.

5. Empoderamento e Autogestão:

Habilitar os colaboradores a terem mais autonomia sobre seu trabalho e ambiente promove a autogestão, o que aumenta o bem-estar e a satisfação.

6. Ambientes de Suporte:

Desenvolver ambientes que suportam o bem-estar físico, mental e emocional, como espaços de trabalho flexíveis, acesso a áreas de descanso e atividades de bem-estar.

7. Comunicação Transparente e Inclusiva:

Fomentar uma comunicação aberta e inclusiva que permite aos colaboradores expressarem suas necessidades e ideias, fortalecendo a comunidade e o suporte mútuo.

8. Aprendizado e Crescimento Contínuos:

Oferecer oportunidades de aprendizado e crescimento contínuos para que os colaboradores possam se desenvolver e se adaptar às mudanças.

9. Conexão com a Natureza:

Integrar elementos naturais no ambiente de trabalho e promover a conexão com a natureza, o que tem mostrado benefícios significativos para a saúde mental.

10. Abordagem Sistêmica:

Reconhecer e abordar a saúde mental não apenas no nível individual, mas também no nível sistêmico, olhando para a organização como um organismo vivo onde todas as partes estão interconectadas.

Liderando a salutogênese mental na prática

Como líderes, podemos adotar várias atitudes e estratégias que não dependem de mais autoridade ou de recursos adicionais, mas que podem ter impacto significativo na saúde mental da equipe. Aqui estão algumas ações que os líderes podem implementar:

1. Pratique a escuta ativa: Demonstrar interesse genuíno pelos colaboradores através da escuta ativa pode ajudar a construir relações de confiança e abrir canais de comunicação. Reconhecer e validar as experiências dos colaboradores pode ser um poderoso catalisador para o bem-estar. Crie espaços na sua agenda para reuniões individuais com os liderados, aguce sua curiosidade e empatia, faça perguntas, conheça a história e desafios do seu liderado ou liderada.

2. Fomente um ambiente de segurança psicológica: Crie espaços de conversa para que os membros da sua equipe possam emitir suas opiniões sem medo de serem julgados, criticados ou retaliados. Em uma sessão de brainstorming, por exemplo, troque o “não, mas…” por “sim, e se…?”.

3. Cuide da própria saúde mental e seja o exemplo: Pratique o autocuidado, faça pausas, seja vulnerável e peça ajuda quando necessário, evite trabalhar longas horas e responder emails fora do horário comercial.

4. Crie espaços para falar sobre emoções e sentimentos: Elimine o estigma de que o trabalho não é lugar para se falar de emoções e sentimentos pois eles afetam a produtividade e podem nos alertar de riscos, necessidades individuais ou coletivas que não estão sendo vistas pela organização. Uma forma eficaz de trazer os sentimentos numa reunião é começar fazendo um check-in e terminar fazendo um check-out. Com que sentimento vocês chegam na reunião hoje? Como você se sentem agora no final da reunião?

Estas ações dependem somente do compromisso e da atitude do líder e não requer de recursos financeiros extras ou mais autoridade. Elas são fundamentais para criar um ambiente de trabalho que apoie a saúde mental e o bem-estar dos colaboradores, levando a construção de uma cultura mais saudável e resiliente.

Se você quer de saber mais sobre como diagnosticar a cultura de sua empresa e implementar práticas salutogênicas na sua organização, deixe um comentário!