Assim como todo o Universo e a natureza têm movimentos de expansão e retração, a liderança evolutiva transita entre dois olhares: olhar para dentro e olhar para fora…
Quando, na cuidadoria, começamos a estudar o trabalho de Frederic Laloux, “Reinventing Organizations”, percebendo seu sentido e alinhamento ao nosso propósito, fomos identificando como este trabalho trazia uma visão realmente integral, considerando ao mesmo tempo ferramentas e pessoas, desenvolvimento humano aliado ao desenvolvimento de um ambiente propício à gestão no nível de consciência “teal”, para o qual nossa sociedade está fazendo a transição e, consequentemente, as organizações.
Nós já vínhamos desenvolvendo alguns trabalhos utilizando o Eneagrama, um sistema de mapeamento da consciência, muito profundo e ao mesmo tempo, prático, extremamente adequado para o desenvolvimento da liderança e da comunicação.
Ao longo dos nossos estudos, algo saltou aos nossos olhos: tanto o Eneagrama quanto o Reinventando as Organizações têm como pilares, 3 grandes pontos que, juntos, formam triângulos.
E, com uma análise mais profunda, começamos a “brincar” com sobreposições… Sobrepondo os triângulos, percebemos que eles tratam dos mesmos assuntos, sob diferentes perspectivas.
A Lei do 3, que representa, no triângulo do Eneagrama, a formação da personalidade e o caminho de retorno à essência. E os pilares da Liderança Evolutiva, de Frederic Laloux. Aspectos diferentes de uma mesma lógica.
O triângulo do Eneagrama trata, basicamente da consciência humana, do nosso mundo interno e de uma dinâmica que chamamos de Lei do 3, que refere-se, na sequência “essência-veracidade-coragem” à forma como o ser humano resgata seus valores mais essenciais, revisita suas crenças para fazer escolhas na vida a partir da sua própria verdade (veracidade) e angariando a coragem necessária para a ação corajosa na vida, realimentando o contato com a essência, num círculo virtuoso de saúde psíquica, autorrealização e auto-atualização constantes.
Laloux trata do mundo externo (sem deixar de considerar o interno), organizacional e da forma como a gestão e a liderança podem desenvolver um ambiente propício ao florescimento das organizações para o nosso momento de mundo e para um futuro muito próximo, que já vem emergindo e é fruto de uma sociedade em rede, com todo tipo de informação disponível, sem hierarquias e onde o que conta é o quantum de reputação cada indivíduo ou grupo alcança a partir do que ele oferece e recebe da própria rede.
Nas organizações evolutivas, o vértice superior do triângulo fala do Propósito Evolutivo, que nos conta de como as organizações são capazes de perceber e responder às mudanças do mundo, sendo permeáveis às informações do contexto externo e ao mesmo tempo dirigidas por valores claros, alinhados ao seu propósito e que determinam a forma como elas respondem aos estímulos externos de forma saudável.
Propósito Evolutivo não significa só que o propósito da organização deve evoluir, mas remete a ter mecanismos para que a organização revisite sua essência a todo momento e que as respostas e adaptações à velocidade do mundo venham exatamente deste lugar de percepção ampliada, de um ponto de vista que está além do imediatismo ou do pensamento dirigido apenas por lucro, mas deste aspecto que dá a “liga” para que as pessoas (tanto colaboradores, quanto clientes) mantenham-se conectadas à organização: a sua essência.
Em resumo, as pessoas que estarão nutrindo a organização, em qualquer ponto da cadeia, “colam” na organização pelo seu propósito! É uma conversa de essência para essência: os valores e propósitos individuais (essência individual) com os valores e propósito da organização.
Esta é a primeira sobreposição.
Na ponta inferior direita do triângulo, temos no Eneagrama a Veracidade, que também pode ser entendida como verdade, honestidade, autenticidade… No contexto individual, o primeiro grande passo da pessoa que começa a se reencontrar com sua essência é o desejo de expressar-se por inteiro no mundo, a partir de sua verdade individual, com autenticidade…
Nas organizações, muitas vezes autenticidade é confundida com criatividade e, quando não é confundida, a autenticidade pode ser vista como algo que pode gerar conflitos, expressões de emotividade, entre outros pontos difíceis de serem tocados…
Na organização evolutiva, o vértice direito do triângulo traz o conceito de Integralidade; acredita que o indivíduo que leva somente o seu lado profissional para o trabalho, leva no máximo 25% do que ele realmente é. Ele leva 25% da sua criatividade, do seu potencial profissional, da sua dedicação, da sua atenção, do seu foco… E deixa do lado de fora da empresa todo o resto.
Quando levamos 100% do que somos, levamos sim, 100% do nosso potencial e também 100% das nossas angústias, dores, fragilidades… E é para isso que a maioria dos ambientes de trabalho não oferece espaço. As organizações estudadas por Laloux têm práticas para construir e manter um ambiente permeado pela confiança, para que as pessoas possam, de fato, se expressar por inteiro, inclusive nas suas vulnerabilidades. E isso traz mais verdade às relações, mais senso de pertencimento e respeito, motivação intrínseca e não uma motivação vinculada a prêmios.
Todos nós sabemos que as pessoas são muito mais do que demonstram ser nos ambientes de trabalho tradicionais… Pra que carregar o peso de tantas máscaras? Não é só gravata, salto alto ou uniformes, mas máscaras que tiram a riqueza de ser humano… E quando olhamos com honestidade, como é possível ser íntegro se não nos levamos por completo para onde quer que vamos? Lembrando que a palavra “íntegro” significa inteiro!
E, por fim, chegamos ao vértice esquerdo do triângulo do Eneagrama, onde a Coragem tem seu lugar. Coragem é agir com o coração. AGIR! Coragem demanda ação, tem a ver com resgatar o nosso herói interno, nos empoderarmos como indivíduos para transformarmos a nossa verdade em obra!
Nos pilares da liderança evolutiva, o vértice esquerdo traz a Autogestão! Gerir a si mesmo em um ambiente que oferece espaço para a transparência, a vulnerabilidade e mesmo, o erro, ajuda a tornar os seres humanos mais adultos, vivenciando a liderança e a interdependência, crescendo em seu potencial de se relacionar e olhar para os conflitos como desafios para a melhoria individual e coletiva. E gerir a própria organização!
As práticas de gestão participativa envolvem desde formas de se fazer uma reunião, estabelecer metas, tomar decisões até formas de contratação, demissão, governança… Na minha visão, uma das grandes vantagens da gestão participativa é despertar o adulto que existe em cada um de nós, que se responsabiliza por ajudar a criar uma organização próspera, não só porque recebe um salário, mas porque se sente realmente parte e porque percebe o sentido de estar ali e crescer junto.
Imagine o quanto é possível evoluir, inovar, criar em organizações que oferecem o ambiente adequado para o nosso florescimento como humanos?!
Assim, na sobreposição destes dois triângulos, criamos na cuidadoria, a Formação de Líderes Evolutivos, com a finalidade de desenvolver os dois olhares, o interno a partir do autoconhecimento, da presença e da expressão individual autêntica e da decisão de gerir a si mesmo e suas realizações com coragem e o olhar externo, trazendo as formas de se criar o ambiente e implementar as ferramentas para que pessoas possam levar às organizações em que atuam a semente da gestão participativa.
Uma união entre conceitos para que, de uma forma dinâmica, seja possível implementar concretamente as práticas das organizações evolutivas, seja na organização como um todo, seja em um departamento.
E tudo parte de estar sempre atento ao movimento natural da vida: olhar para dentro e olhar para fora…